ITBI - STJ decide que o preço na escritura tem presunção de valor de mercado

O Imposto sobre a Transmissão onerosa de Bens Imóveis, conhecido pela sigla ITBI, é de competência dos municípios, que pode exigi-lo a cada vez que houver transmissão onerosa de bem imóvel ou direito real sobre imóvel.

A compra e venda de um apartamento, por exemplo, é um caso típico de transação sujeita à sua incidência, em que o pagamento é exigido antes do registro da escritura no cartório imobiliário.

Uma vez que o país conta com mais de 5 mil municípios, a chance de ocorrer erros e abusos nessa tributação é enorme. Em geral, as disputas entre as secretarias de fazenda e os contribuintes dizem respeito à base de cálculo do imposto, isto é, ao valor sobre o qual incide a alíquota.

O Código Tributário Nacional - CTN diz que a base de cálculo do ITBI é o valor venal do imóvel, que é o seu valor para venda em condições normais de mercado.

Assim, nas operações de compra e venda, a base de cálculo do ITBI é o preço fixado pelas partes na escritura pública, pois deve-se presumir a boa-fé dos contratantes na estipulação do preço do negócio.

No entanto, em razão de alguns contribuintes estipularem em contrato valores inferiores ao que de fato estão realizando, as prefeituras passaram a desconfiar de todos os contribuintes, dando a eles tratamento de sonegadores em potencial.

Em função disso, passaram a desconsiderar o preço como base de cálculo do tributo, que passou a ser a pauta de valores venais de referência municipal. O contribuinte envia os dados da transação para a prefeitura, para efetuar o cálculo do tributo, e recebe de volta uma guia com base de cálculo maior do que o valor do negócio - em alguns casos, com valor muito maior.

A contragosto, muitos pagam porque querem resolver logo a transação, e o Fisco municipal usa isso a seu favor. Mas esse procedimento recebeu um duro golpe do STJ na última semana (24/02/2022), quando do julgamento do Recurso Especial nº. 1.937.821 (Tema 1113 dos Recursos Repetitivos), que tinha por objeto lei do Município de São Paulo.

A legislação paulistana previa o arbitramento prévio da base de cálculo do ITBI, na forma de “valor venal de referência”, desconsiderando o preço informado pelas partes no contrato (salvo se superior ao valor da prefeitura). O STJ então decidiu que o valor declarado pelas partes tem a presunção de que é condizente com o valor de mercado, que só pode ser afastado mediante processo administrativo, dando aplicação ao art. 148, do CTN, que diz:

Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.

Assim, as prefeituras não podem mais aplicar o “princípio da desconfiança” sem motivação idônea, pois devem, antes, apontar as razões pelas quais as declarações prestadas pelos contribuintes não merecem fé, para só então arbitrar a base de cálculo, assegurada a participação do contribuinte no processo de avaliação.

Esse entendimento se aplica a todos os municípios que contam com semelhante previsão, de modo que deve o contribuinte ficar atento a exigências indevidas como esta. Na eventualidade de já ter efetuado o pagamento a maior, cabe a devolução do que foi pago em excesso.

Apesar de essa decisão ter sido tomada em recurso repetitivo pelo STJ, que é de observância obrigatória, não é esperado que os municípios obedeçam por conta própria. Assim, cabe aos contribuintes interessados a busca de seus direitos em ação judicial.

Por fim, saliente-se que esse entendimento também aproveita ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD, ITCD, ICD, ITD), pois alguns estados também se utilizam de pauta de valores de referência para arbitrar previamente o valor de imóveis, quando da realização de inventários extrajudiciais ou escrituras de doação.

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RODRIGO RODRIGUES DE FARIAS

Advogado tributarista especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, com extensão em Planejamento Tributário pelo IBMEC/RJ, Direito Societário pela Fundação Getúlio Vargas - FGV e Falência e Recuperação de Empresas, também pela Fundação Getúlio Vargas - FGV. Tem artigos publicados na imprensa especializada e experiência em matéria tributária tanto no âmbito operacional como no judicial. Inscrito na OAB/MG sob o nº. 205.912. Acesse o perfil no LinkedIn e saiba mais.