ICMS/MG: presunção de omissão de receitas

Ser tributado, ter de pagar impostos, não é um fenômeno aceito com facilidade por alguns, especialmente em contextos em que esse fato tem contornos de injustiça. Por isso, há aqueles que deliberadamente buscam subtrair da tributação determinados fatos econômicos. Outros, porém, não os levam à tributação apenas por desorganização.
Em todo caso, a legislação conta com instrumentos de aferição indireta dos fatos tributáveis omitidos, que operam por meio de presunções. Interessa analisar nesse texto as presunções utilizadas pela Fazenda Estadual de Minas Gerais quando da fiscalização do ICMS, notadamente o seu mal uso em determinados casos, que requerem atenção e resposta tempestiva do contribuinte.
Em procedimentos de fiscalização do ICMS, é procedimento padrão a requisição dos documentos contábeis da empresa, como Livro Diário etc. Pode parecer estranha essa exigência, pois, a rigor, ela não tem muita pertinência com o fato gerador do ICMS, que é a circulação de mercadorias e a prestação de serviços de transportes e comunicações. Sob essa perspectiva, bastaria a documentação correspondente a essas operações, como notas e livros fiscais.
Mas ela tem sua razão de ser. É que o Fisco busca, pela sua análise, identificar inconsistências indicativas de sonegação, como, por exemplo, vendas sem emissão de notas fiscais.
A esse respeito, a legislação de Minas Gerais toma de empréstimo as normas federais, previsão que está contida no art. 49, § 2º, da Lei Estadual nº. 6.763/75, que tem a seguinte redação:

§ 2º Aplicam-se subsidiariamente aos contribuintes do ICMS as presunções de omissão de receita existentes na legislação de regência dos tributos federais.

As regras de presunção mais importantes contidas na legislação federal são as previstas nos artigos 40 a 42, da Lei nº. 9.430/96, no art. 12, § 2º, do Decreto-lei nº. 1.598/77, e no art. 2º, da Lei nº. 8.846/94.
Em resumo, elas caracterizam a omissão de receitas por presunção em casos de passivo fictício, inconsistência de estoques, depósitos bancários sem origem comprovada, saldo credor de caixa e subfaturamento de nota fiscal.
É preciso, contudo, acompanhar de perto a atuação da fiscalização nesse particular, sob pena de o contribuinte se ver obrigado a pagar mais do que deveria. Isso porque nem todas as presunções previstas na legislação federal se prestam para o campo do ICMS, pois, a rigor, trata-se de presunção de receitas, e o ICMS não tem por fato gerador a receita. Há identidade apenas parcial entre os eventos que caracterizam obtenção de receita e, ao mesmo tempo, representam circulação de mercadoria. Por exemplo, a presunção de omissão de receitas de vendas de mercadorias serve para os tributos federais assim como para o ICMS. O mesmo não pode ser dito quando se trata da omissão de receita da venda de um imóvel do ativo imobilizado, pois esse fato não está inserido no campo de incidência do ICMS.
Em outras situações, o contribuinte pode exercer atividades que não estão inteiramente inseridas no campo de incidência do ICMS, porque também contribuinte do ISS. Nesses casos, na ausência de indícios de que a omissão se deu inteiramente nas atividades sujeitas ao ICMS, a alocação das receitas omitidas deve ser feita de modo proporcional às atividades exercidas. Exemplifico. Um determinado contribuinte tem faturamento anual de 10 milhões, sendo 8 milhões decorrentes de atividades sujeitas ao ICMS e 2 milhões de serviços tributados pelo ISS. Se o Fisco Estadual identifica, naquele período, 3 milhões de receitas omitidas, não pode submeter esse 3 milhões inteiramente ao ICMS, a não ser que haja indícios de vinculação da receita omitida com a atividade sujeita ao ICMS. Do contrário, apenas 2 milhões e 400 mil deveriam ser tributados pelo ICMS, em observância à proporção de cada tributo a que se sujeitam suas atividades.
Isso é muito importante de ser observado, pois pode ocorrer de esse mesmo contribuinte ser fiscalizado pelo município, pelos mesmos critérios de omissão de receita, e também sofrer a exigência do ISS pela totalidade da receita omitida, o que o deixaria na situação de ser cobrado pelo ICMS e ISS, impostos mutuamente excludentes, sobre a mesma materialidade econômica.
É por situações como essas que é importante acompanhar desde o início as atividades de fiscalização, ainda que o contribuinte tenha, de fato, cometido infrações fiscais, pois elas nem sempre são feitas com a correção esperada e podem resultar em dívida superior à devida.

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RODRIGO RODRIGUES DE FARIAS

Advogado tributarista especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, com extensão em Planejamento Tributário pelo IBMEC/RJ, Direito Societário pela Fundação Getúlio Vargas - FGV e Falência e Recuperação de Empresas, também pela Fundação Getúlio Vargas - FGV. Tem artigos publicados na imprensa especializada e experiência em matéria tributária tanto no âmbito operacional como no judicial. Inscrito na OAB/MG sob o nº. 205.912. Acesse o perfil no LinkedIn e saiba mais.

Rodrigo Rodrigues de Farias